No Jardim Brotinho, onde as vielas silenciosas guardam histórias que o tempo quase esqueceu, uma intervenção artística devolveu brilho, memória e orgulho a um espaço que clama por visibilidade. A viela conhecida pelos próprios moradores como “Vila do Chaves” virou cenário de um projeto encantador e potente, que uniu talento, afeto e propósito.
Com apoio da Lei de Fomento à Cultura Aldir Blanc (Edital 06/2024/SMCT), o artista cultural Henrique Riello Floriano, de apenas 23 anos, idealizou e executou uma verdadeira galeria a céu aberto. Foram sete dias de trabalho intenso, quatro grafiteiros, olhares atentos dos moradores e o som vibrante do DJ Sonoro para encerrar a ação. Tudo isso cuidadosamente registrado pelas lentes sensíveis do fotógrafo Adriano Mendez.
Mais do que tinta sobre muros, o que se viu foi uma transformação coletiva: o cinza cedeu espaço à memória afetiva e à arte colorida que abraça. A viela ganhou vida nova e os moradores, novos motivos para se orgulhar do lugar onde vivem.
Henrique, cuja trajetória começou ainda na infância observando os murais urbanos da capital paulista, tem na arte urbana uma missão clara: resgatar espaços esquecidos, dar voz a histórias invisibilizadas e provocar novas conexões. Inspirado pelo seriado “Chaves”, que marcou gerações com humor e humanidade, o projeto foi também uma forma de homenagear a comunidade local — acolhedora, resiliente e cheia de vida.
A seguir, você confere a matéria completa sobre o processo criativo, os desafios enfrentados, a participação da comunidade e os sonhos futuros de um jovem artista que acredita que o grafite pode, sim, transformar o mundo — viela por viela.
Das cores à convivência: um projeto que ressignifica espaços e histórias
Henrique Riello Floriano sabe bem que arte e afeto caminham lado a lado. E foi com esse espírito que ele liderou a realização do projeto “Vila do Chaves”, no Jardim Brotinho, bairro localizado no município de Jandira (SP) uma iniciativa artística que devolveu cor, dignidade e cuidado a uma viela que por tanto tempo permaneceu invisível aos olhos da cidade.
A escolha do local não foi aleatória: a viela já era conhecida pelos moradores como “Vila do Chaves”, em referência ao famoso seriado mexicano que, com humor simples e personagens cativantes, marcou a infância e juventude de muita gente. “Pensamos em fazer uma homenagem tanto ao seriado quanto à comunidade que ali habita. Queríamos transmitir acolhimento, pertencimento. Fazer com que se sentissem vistos”, explica Henrique.
Durante uma semana, quatro artistas grafiteiros — Pretotna, Joks Johnes Alves, Gen3sis e Allan Destrone — se dedicaram a transformar cada metro quadrado da viela em um painel artístico cheio de referências, cores e significados. Com estilos distintos, mas objetivos em comum, os artistas conversaram, planejaram, desenharam juntos cada personagem, cada cenário. O resultado foi uma composição harmoniosa que conversa com o entorno e convida quem passa a olhar com mais carinho para o espaço e para si mesmo.
O encerramento do projeto contou com a presença do DJ Sonora, que embalou a comunidade em uma tarde de celebração. O fotógrafo Adriano Mendez, com olhar sensível e atento aos detalhes, eternizou o processo e o envolvimento da comunidade em belos registros fotográficos.
Arte que transforma e provoca cuidado
Não demorou muito para que o impacto da intervenção começasse a ser percebido. “Notamos que as pessoas começaram a cuidar mais do local, pararam de jogar lixo na viela, houve diminuição de pichações e até uma sensação maior de segurança. A arte provoca esse movimento. Ela atrai olhares, mas também ensina a respeitar”, conta Henrique.
O projeto, realizado com apoio da Lei de Fomento à Cultura Aldir Blanc, expôs também uma das maiores dificuldades enfrentadas por artistas urbanos em cidades periféricas como Jandira: o pouco apoio e reconhecimento institucional. “Ainda é difícil conseguir incentivo. A cidade é carente de projetos que valorizem o grafite, e isso impacta diretamente nosso alcance e relevância”, lamenta Henrique. Mas ele segue firme, determinado a ampliar os horizontes da arte urbana em sua região.
Do olhar sensível ao futuro promissor
A história de Henrique deu os primeiros passos na arte ainda adolescente, quando se envolveu com a marcenaria. A prática o ajudou a desenvolver atenção aos detalhes, criatividade e paciência — competências que hoje se refletem em seu trabalho artístico. Em 2021, sua trajetória ganhou um novo capítulo ao integrar o projeto Operação Viela, onde teve contato direto com o grafite e percebeu seu potencial de transformação social.
Mais tarde, em 2022, foi convidado a integrar a equipe de cenografia da Rota do SESC, trabalhando com o coletivo Dos Anjos — uma experiência que ampliou sua visão e fortaleceu sua missão de usar a arte como ponte entre pessoas e territórios.
Henrique acredita que todo espaço pode ser palco de arte. E que toda viela esquecida pode ser um convite à reflexão. “Gostaria que os artistas de Jandira tivessem mais espaço. Que artistas de outras regiões também pudessem vir aqui, trocar experiências. Isso abriria horizontes. A arte precisa circular.”
Participação da comunidade: o ingrediente essencial
O envolvimento dos moradores foi um dos pontos altos do projeto. Desde o início, a equipe se preocupou em dialogar com a comunidade, ouvir histórias, entender as necessidades e os desejos daquele território. “Eles foram extremamente receptivos. Nos ajudaram, estiveram presentes. Ouvimos muito: ‘até que enfim alguém lembrou da gente’. E é exatamente isso que queremos: lembrar, reconhecer, valorizar”, relata Henrique, emocionado.
Planos para o futuro: grafite como identidade
Henrique e a equipe Gallery KM32 têm planos ambiciosos. Pretendem levar o projeto para outras vielas de Jandira e também para pontos centrais da cidade, com intervenções que remetam à história local, acontecimentos marcantes e paisagens típicas. “Queremos que as pessoas vejam a arte no cotidiano. Que ela esteja onde menos se espera, trazendo pertencimento e beleza.”
Mensagem para jovens artistas
Ao ser questionado sobre o que diria para jovens artistas que desejam seguir o mesmo caminho, Henrique é direto e generoso:
“Acredite nos seus sonhos e agarre as oportunidades com todas as suas forças. Terão pessoas no caminho dispostas a ajudar, mas as coisas só acontecem se você se entregar de verdade. Não importa as dificuldades, não desista.”
Para acompanhar mais do trabalho do Henrique e do coletivo Gallery KM32
Instagram: @gallerykm32
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Texto: Adriana Biazoli
Jornalismo com propósito