Vagner Luís da Silva Ribas: entre tijolos, livros e sonhos, a construção de um homem

Coluna Jandira

“A vida na chácara era difícil, sem banheiro, sem chuveiro… mas valeu a pena”, relembra ele, com um tom que mistura dureza e ternura.

Por Adriana Biazoli

Há histórias que não se leem apenas com os olhos — é preciso ouvi-las com o coração. Vagner Luís da Silva Ribas, 47 anos, nascido em Osasco, filho de Maria Pureza da Silva Ribas e Paulo Roberto Ribas, é dessas pessoas que transformam dores em força e trilham um caminho improvável com coragem e dignidade. Professor. Advogado. Filho. Irmão. Namorado. Homem feito pelas próprias mãos.

“Vamos mergulhar nesta história real, a trajetória de um garoto que, entre cuidar dos animais e catar lenha para aquecer a água do banho, aprendeu cedo o significado da responsabilidade. Foi ali, em meio às limitações da vida rural, que Vagner encontrou na escola um verdadeiro refúgio.”

Nesta entrevista exclusiva, Vagner compartilha sua caminhada desde a infância marcada por dificuldades até a conquista da sala de aula e do Direito. Um relato emocionante, que inspira e fortalece.

Onde você nasceu e como foi sua infância?

Nasci em Osasco, mas fui criado em Mogi das Cruzes, numa chácara sem estrutura — sem banheiro interno, sem chuveiro, com muitas tarefas e responsabilidades. Minha mãe se separou do meu pai quando eu tinha dois meses. Crescemos com muito esforço. Aos 13 anos, por problemas familiares, fugi de casa e fui morar com minha avó, que faleceu pouco tempo depois. Acabei vivendo com um tio e depois construí um barraco de 4×8 com a ajuda de colegas do Magistério. Foi uma adolescência difícil, marcada por responsabilidades precoces.

Como era sua relação com a escola?

Apesar de começar a estudar tardiamente, com 8 anos e meio, eu adorava a escola. Ela era um refúgio. Era o único momento do dia em que eu podia ser apenas criança e não precisava cuidar de animais ou catar lenha. Nunca fui o melhor da sala, mas sempre acompanhei as aulas com dedicação.

Sua família valorizava a educação?

Não da forma como deveria. Acho que não havia consciência da importância do estudo. Minha mãe e meu padrasto não cobravam isso, mas eu entendia, desde cedo, que o estudo era o único caminho possível para mudar a minha realidade.

Quando começou a trabalhar?

Desde os 14 anos. Fiz de tudo: carpia, carregava tijolos, entregava panfletos, vendia produtos nas ruas… Aos 16 anos, já trabalhava como ajudante de pedreiro durante o dia e estudava à noite. Era uma rotina muito cansativa, mas o salário ajudava a custear minhas despesas.

Como surgiu o interesse pelo Magistério?

Na verdade, foi por causa da bolsa de estudos do CEFAM. Minha tia Terezinha me contou que os alunos recebiam um salário para estudar. Fiz o concurso, passei em 33º lugar entre 90 vagas e comecei o curso em 1994, sem nem saber direito o que era ser professor. Mas ali tudo mudou. Costumo dizer que não tenho nada na vida, mas tudo o que tenho, devo ao CEFAM.

Como era sua rotina no Magistério?

Muito intensa. Estudávamos em período integral, participávamos de atividades culturais, visitas técnicas, viagens para cidades históricas. Os nossos professores — que chamávamos de mestres — eram altamente qualificados e comprometidos. Foi uma formação de excelência. Foi no CEFAM que ganhei estrutura, visão de mundo, autoestima e amigos para a vida toda.

Algum professor te marcou nesse período?

Sim. O mestre Osny Vieira, professor de Biologia. A história de vida dele me inspirou muito. Ele foi um dos motivos pelos quais comecei a sonhar em ser professor e, mais tarde, cursar Direito.

Como foi sua primeira experiência como professor?

Tranquila. Já estávamos preparados pelos estágios e formações. Assumi minha primeira turma em 1999, na pré-escola de Jandira. Uma sala com 24 crianças. Ensinar me preenche de uma forma que nenhuma outra profissão consegue.

Você também atuou na Educação de Jovens e Adultos. Como foi essa experiência?

Foi transformadora. Ensinar na EJA é lidar com histórias de superação todos os dias. Vi adultos, mães, pais, avós, buscando aprender a ler e escrever para poder assinar o próprio nome, ajudar os filhos nas lições, ou realizar um sonho antigo. É um espaço de acolhimento e reconstrução da dignidade. A troca é imensa: a gente ensina, mas aprende ainda mais.

Quando decidiu cursar Direito?

Sempre tive esse sonho. Pensava: se não posso ser um doutor da medicina, por que não do Direito? Iniciei o curso em 2002 ou 2003. Não foi fácil. Trabalhava como professor, fazia estágio e ainda estudava. Mas nunca pensei em desistir.

Você enfrentou preconceito ou dificuldades durante a faculdade de Direito?

Sim. Era um ambiente elitizado, com muitos alunos de classe alta. Senti a diferença. Mas encontrei apoio em colegas do meu grupo de estudo. Trabalhamos juntos, nos ajudamos. Não me lembro de professores marcantes como no Magistério, mas o esforço valeu a pena.

Quem mais te incentivou ao longo dessa trajetória?

Minha tia Terezinha. Ela foi fundamental, me apoiava nas decisões, ia às reuniões da escola quando eu não tinha pais presentes. Também destaco o apoio de amigos, especialmente na época do Magistério. Sem eles, muita coisa teria sido impossível.

Hoje, como você enxerga sua caminhada?

Com gratidão. A educação foi o alicerce de tudo. Sou professor há 26 anos ininterruptos e advogado por formação. Tenho orgulho da minha trajetória. Cada tijolo que carreguei, cada caderno que preenchi, cada desafio que enfrentei, tudo me trouxe até aqui.

Qual é a mensagem você sempre passa para seus alunos sobre estudar e não desistir?

Sempre digo pros meus alunos que não tem obstáculo no caminho que a gente não consiga tirar. Se aparecer, é a gente que tem que remover. Todo mundo pode chegar onde quiser, é querer de verdade e seguir com retidão, fazendo o certo.”

Vagner Luís da Silva Ribas é a prova viva de que a educação transforma.

Com sua história, ele mostra que o lugar de origem não define o destino — e que, com coragem, afeto e persistência, é possível plantar um futuro novo, mesmo quando o terreno parece infértil.

 

Sobre a autora

Adriana Biazoli

Adriana Biazoli é jornalista, escritora, contadora de histórias e apaixonada pela arte de comunicar. Já atuou como radialista, apresentadora de TV e mestra de cerimônias, mas é entre crianças, festas e histórias que encontra sua verdadeira paixão. Com olhar sensível e escuta atenta, transforma encontros do cotidiano em narrativas que tocam o coração. Seu propósito é ensinar pessoas a se comunicar bem — com palavras, com presença e com afeto.
Instagram: @adriansabiazoli
Email: biazoliadriana@gmail.com

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