A Dicotomia na Segurança Pública
A presença de policiais conhecidos por seu descontrole ou histórico de violência amplifica a pressão sobre os colegas que muitas vezes enfrentam dilemas éticos em relação à denúncia ou aceitação desse comportamento.
Pouco se fala sobre isto, mas neste artigo quero destacar algo de suma importância, no episódio da família de Barueri, onde uma mulher de 63 anos foi agredida por um policial militar, nas imagens veiculadas é possível ver uma policial tentando acalmar o policial na condução daquele ato, no depoimento da idosa a imprensa, ela destaca que nem todos agiam com brutalidade, posteriormente, todos os policiais envolvidos estão em funções administrativas.
Há um ditado que diz que uma laranja podre adoece outras, um mal policial pode sim adoecer os bons, o que leva um policial a buscar a carreira na segurança, mesmo sabendo dos riscos que corre, mesmo sabendo que o salário não é tão compensador assim?
Acredito que seja para garantir a lei e a ordem e proteger o cidadão de bem, pelo menos supostamente, essa seria a principal razão.
E quando o bom policial se depara com “colegas” cuja conduta é violenta e desajustada? Certamente esse comportamento gera um impacto significativo tanto na percepção pública da polícia quanto na saúde mental dos próprios agentes.
Desta forma, os bons policiais frequentemente se encontram pressionados, não apenas pela natureza estressante do trabalho, mas também pela convivência com colegas cuja conduta viola os princípios éticos e legais, o que pode causar dilemas morais e tensões no ambiente de trabalho.
Vozes silenciadas
Dados da edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicada em junho de 2023 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelam que o adoecimento mental é uma questão séria entre policiais. O número de suicídios entre agentes de segurança supera o de mortes em confrontos diretos em várias regiões do Brasil. Em São Paulo, por exemplo, os suicídios de policiais militares cresceram 80% em 2023, passando de 19 casos em 2022 para 31 em 2023. No Rio de Janeiro, o aumento foi ainda mais acentuado, com 116,7% de crescimento no mesmo período. Além disso, estados como Minas Gerais e Paraná também registraram mais suicídios do que mortes em serviço, o que reforça a gravidade do problema de saúde mental entre policiais em todo o país.
A presença de policiais conhecidos por seu descontrole ou histórico de violência amplifica a pressão sobre os colegas, que muitas vezes enfrentam dilemas éticos em relação à denúncia ou aceitação desse comportamento. Adicionalmente, a banalização da violência policial, refletida em casos de execuções sumárias ou uso desproporcional da força, afeta não só a sociedade, mas também os próprios agentes que buscam manter uma conduta profissional. Essa realidade destaca a necessidade de políticas eficazes de apoio psicológico, supervisão rigorosa e mudanças estruturais nas corporações policiais para garantir um ambiente saudável e ético tanto para os agentes quanto para a comunidade.
Essas estatísticas e reflexões reforçam a importância de tratar o problema com seriedade, implementando programas de saúde mental para os agentes e promovendo a responsabilização de policiais com histórico de má conduta para preservar a integridade do sistema de segurança pública.
A convivência entre policiais éticos e colegas com condutas violentas traz à tona não apenas dilemas éticos e morais, mas também reforça a crise de saúde mental na corporação, afetando tanto a percepção pública quanto os próprios agentes. Casos recentes de violência policial com grande repercussão destacam essa realidade, mostrando o impacto devastador dessas ações na sociedade e no próprio ambiente policial.
Casos Marcantes
Jovem arremessado da ponte em São Paulo (2023): Durante uma abordagem policial, um jovem foi brutalmente arremessado de uma ponte no bairro de Belém, na Zona Leste da capital paulista. A ação, gravada e amplamente divulgada, levantou protestos sobre o uso desproporcional da força e a necessidade de responsabilização de policiais envolvidos.
Universitário morto em um hotel no Rio de Janeiro: Em um caso que chocou o país, o estudante de medicina da UFRJ, João Pedro Matos Pinto, foi encontrado morto em um hotel, com indícios de violência em uma ação policial. A família e organizações de direitos humanos questionaram a abordagem, reforçando debates sobre violência policial e o abuso de autoridade.
Filho de vítima da Operação Verão morto em Santos: Ryan da Silva Andrade Santos, de apenas 4 anos, foi baleado e morto durante uma ação policial em Santos, no litoral de São Paulo. O menino era filho de Leonel Andrade, uma das vítimas da polêmica Operação Verão, que já havia sido marcada por críticas severas ao comportamento policial. O caso comoveu o país e trouxe reflexões sobre os impactos de operações policiais mal planejadas em comunidades vulneráveis.
Adoecimento dos Policiais
Além das consequências para a sociedade, policiais éticos enfrentam pressão para conviver com colegas desajustados. O impacto dessa convivência, aliado à natureza estressante da profissão, contribui para índices alarmantes de adoecimento mental e suicídio nas corporações. Dados recentes indicam que em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, o número de suicídios entre policiais ultrapassou o de mortes em serviço, expondo a crise psicológica nas forças de segurança.
O Papel das Câmeras Corporais Como Inibidor de Abusos
Os episódios de violência policial ilustram a urgência de mudanças estruturais nas forças de segurança, tanto para restaurar a confiança pública quanto para preservar o bem-estar dos agentes. Nesse contexto, a implementação de câmeras corporais destaca-se como uma solução prática e indispensável.
Câmeras Corporais: Transparência e Inibição de Abusos
Além de registrarem as interações entre policiais e cidadãos, as câmeras corporais desempenham um papel preventivo. Sabendo que suas ações estão sendo monitoradas, tanto os policiais quanto os cidadãos tendem a adotar comportamentos mais cautelosos, reduzindo conflitos e abusos. Entre seus principais impactos, destacam-se:
Inibição da violência: O simples fato de estar sob vigilância inibe excessos por parte dos policiais e atitudes agressivas de cidadãos.
Evidências concretas: Em situações de acusações mútuas, as gravações servem como provas imparciais, facilitando investigações e julgamentos justos.
Promoção da conduta ética: O monitoramento constante reforça a necessidade de ações dentro da legalidade, valorizando os bons policiais.
Casos Reais e o Potencial das Câmeras
Casos como o do jovem arremessado da ponte e o menino de 4 anos morto durante uma operação policial destacam a urgência de medidas que inibam ações violentas. Se houvesse gravações completas desses episódios, as investigações seriam mais ágeis e transparentes, além de possivelmente terem prevenido tais tragédias.
Outras Soluções Complementares
- Treinamento contínuo: Instruções regulares em direitos humanos e uso proporcional da força.
- Programas de apoio psicológico: A criação de espaços seguros para que policiais lidem com o estresse e a pressão do trabalho.
- Mecanismos de supervisão: Revisão periódica das condutas de agentes, especialmente daqueles com histórico de violência.
O Futuro das Forças de Segurança
A adoção de câmeras corporais não é uma solução isolada, mas parte de um pacote de reformas estruturais que inclui supervisão rigorosa, programas de saúde mental e treinamentos em direitos humanos. Esses esforços devem ser voltados para a construção de forças policiais mais transparentes, justas e humanas, onde tanto a sociedade quanto os bons policiais se sintam protegidos.
Conclusão
O uso de câmeras corporais representa um divisor de águas no enfrentamento à violência policial. Elas não apenas trazem transparência, mas criam um ambiente de inibição para comportamentos abusivos, permitindo que os bons policiais exerçam suas funções com segurança e ética, e que a sociedade recupere a confiança em suas instituições de segurança. Reformas bem implementadas têm o poder de salvar vidas, reconstruir a reputação das polícias e transformar a relação entre agentes e a população que servem.
Reflexão e Soluções
Os casos destacado nas mídias como os citados ressaltam a urgência de mudanças estruturais nas polícias, que devem incluir:
- Treinamentos sobre direitos humanos e uso proporcional da força.
- Supervisão rigorosa para evitar impunidade de policiais com histórico de violência.
- Ampliação de programas de apoio psicológico para policiais, reduzindo o estigma em buscar ajuda.
As consequências da violência policial vão além das vítimas diretas, afetando a confiança da sociedade nas forças de segurança e o bem-estar dos policiais que agem dentro da legalidade. A necessidade de reformas é inadiável para que vidas sejam protegidas e a justiça prevaleça.
Colunista – Gláucia Martinelli